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Primeiras impressões e breves comentários à lei 14.457/22

A lei 14.457 de 21 de setembro de 2022, publicada no DOU de 22/9/22, instituiu o Programa Emprega + Mulheres e alterou a Consolidação das Leis do Trabalho. Trata-se, na verdade, da conversão em lei, da Medida Provisória 1.116 de 04 de maio de 2022, com as alterações inseridas pelo Congresso Nacional.

A nova lei, alterou ainda:

A lei 11.770/08, que criou o Programa Empresa Cidadã (prorrogação da licença-maternidade mediante concessão de incentivo fiscal);
A lei 13.999/20, que instituiu o Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte;
A lei 12.513/11, que instituiu o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) e alterou as Leis 7.998/90 (Programa do Seguro-Desemprego, o Abono Salarial e instituiu o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).

O novo Programa “Emprega + Mulheres”, estabelecido na lei em foco, tem por objetivo principal, segundo o seu art. 1º, a inserção e manutenção de trabalhadoras no mercado de trabalho, com a implementação de medidas sociais, como o apoio à parentalidade (pais e mães) na primeira infância, pagamento de reembolso-creche e apoio a instituições de educação infantil.

A expressão “parentalidade” é conceituada na lei como o “vínculo socioafetivo maternal, paternal ou qualquer outro que resulte na assunção legal do papel de realizar as atividades parentais, de forma compartilhada entre os responsáveis pelo cuidado e pela educação das crianças e dos adolescentes, nos termos do parágrafo único do art. 22 da lei 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente).”

Não se trata, portanto, de lei que trate apenas do trabalho feminino e da proteção à maternidade, mas sim de diploma voltado à parentalidade, abrangendo, assim, os trabalhadores sob a ótica da maternidade e a paternidade, bem como filhos destes, além de flexibilizar regras trabalhistas para determinados grupos e condições, regrando alguns institutos da esfera da legislação do trabalho em vigor.

No campo das relações de trabalho, trata a lei do apoio à parentalidade por meio do reembolso-creche, sem natureza salarial e sem encargos, flexibilização do regime de trabalho, do regime de tempo parcial, do banco de horas, da adoção da jornada de 12×36, da antecipação de férias individuais, mesmo sem período aquisitivo completo e da flexibilização dos horários de entrada e de saída do trabalho.

Quanto à qualificação profissional, a nova lei trata da inserção de mulheres em “áreas estratégicas” para a ascensão profissional e na criação da suspensão do contrato de trabalho para fins de qualificação profissional e no estímulo à ocupação por mulheres das vagas em cursos de qualificação dos serviços nacionais de aprendizagem, com priorização para “mulheres hipossuficientes”, vítimas de violência doméstica e familiar.

Além disso, aborda o tema do retorno ao trabalho das mulheres após o término da licença-maternidade, bem como a possibilidade de suspensão do contrato de trabalho de pais empregados, para acompanhamento do desenvolvimento dos filhos, além de estabelecer a flexibilização do usufruto da prorrogação da licença-maternidade da lei 11.770/08, tal como constava já na Medida Provisória 1.116/22 que deu origem à lei.

Cria, também, como forma de reconhecimento de boas práticas na promoção da empregabilidade das mulheres, a instituição do “Selo Emprega + Mulher”, assim como aponta caminhos aos empregadores para prevenção e combate ao assédio sexual e a outras formas de violência no âmbito do trabalho, mediante ações e novas atividades da CIPA das empresas, que passa a ser denominada “Comissões Internas de Prevenção de Acidentes e de Assédio”.

Disciplina, ainda, o estímulo e a concessão de microcrédito para mulheres.

Feito esse brevíssimo resumo, passamos à análise dos pontos e aspectos mais significativos da lei 14.457/22:

I. Reembolso-creche

Quanto ao reembolso creche, a nova lei autoriza as empresas a adotarem o benefício de pagamento de “reembolso-creche”, previsto na lei 8.212/91, desde que cumpridos alguns requisitos, com destinação para creches ou pré-escolas, ou ressarcimento de gastos da mesma natureza, mediante comprovação de despesas.

O benefício, que ainda será disciplinado por ato do Poder Executivo Federal, para dispor sobre os limites de valores, as modalidades de concessão e o pagamento a pessoas físicas, não poderá ser discriminatório (deve abranger empregados e empregadas), nem ter caráter de prêmio e deverá abranger empregada ou empregado com filhos de até 5 anos e 11 meses de idade, sob pena de não se enquadrar a concessão na esfera do parágrafo 9º, do art. 28, da lei 8.212/91.

Quanto aos atos necessários para a sua utilização, obriga a lei que o empregador dê ciência às empregadas e empregados, quanto à existência de tal benefício, bem como dos atos necessários para a sua utilização.

Para implementação do benefício, será necessária formalização de acordo individual entre empregado e empregador, ou acordo coletivo entre empresa e sindicato de trabalhadores, ou, ainda entre sindicato patronal e sindicato de trabalhadores, com estabelecimento de condições, prazos e valores.

Uma vez cumpridos os requisitos legais previstos na lei, as quantias pagas a título de reembolso-creche não terão natureza salarial, não se incorporarão à remuneração para quaisquer efeitos e não constituirão base de incidência de contribuição previdenciária ou do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), além de não configurarem rendimento tributável dos empregados. Consequentemente, pelo que se pode deduzir do texto legal, se não cumpridos os requisitos acima apontados, se descaracterizaria o reembolso-creche com essas características tributárias, e geraria encargos sociais,

Repetindo o parágrafo 1º do art. 389 da CLT, a nova lei reafirma, ainda, que os estabelecimentos em que trabalharem pelo menos 30 mulheres com mais de 16 anos de idade terão local apropriado onde seja permitido às empregadas guardar sob vigilância e assistência os seus filhos no período da amamentação. Entretanto, os empregadores que adotarem o benefício do reembolso-creche para todos os empregados e empregadas que possuam filhos com até 5 (cinco) anos e 11 (onze) meses de idade na forma da nova lei, ficam desobrigados da instalação de local apropriado para a guarda e a assistência de filhos de empregadas no período da amamentação.

Recorde-se aqui que o parágrafo 2º, do art. 389 da CLT que dispõe sobre a substituição da manutenção de creches se daria apenas por meio de creches distritais mantidas por convênio ou pelas próprias empresas em regime comunitário, muito embora vários instrumentos normativos firmados (acordos ou convenções coletivas) já dispunham sobre a hipótese de reembolso-creche.

Quanto ao papel do SESI, SESC, SEST, o novo instrumento refere que estes poderão manter instituições de educação infantil destinadas aos dependentes dos empregados e empregadas vinculados às atividades econômicas a eles correspondentes.

A dúvida que surge de imediato é sobre os acordos coletivos e convenções coletivas que já dispõem hoje sobre o reembolso-creche, ou vantagens semelhantes (auxílio-babá, auxílio-creche), com critérios diferentes da nova lei, inclusive quanto aos requisitos, tempo de concessão do benefício em razão da idade do filho, e modalidades possíveis de prestação de serviços.

A princípio, entendemos válidas as cláusulas em vigor sobre o tema, dos instrumentos normativos firmados antes da nova lei, estendendo-se tal validade durante o prazo de vigência ajustado pelas partes, mormente quando haja no instrumento regra que aponta a natureza não salarial e sim indenizatório da vantagem concedida, conforme inúmeras decisões judiciais e administrativas sobre o tema. Preconiza-se aqui, portanto, pela caracterização e defesa do ato jurídico perfeito, a proteger as partes contratantes.

Já no tocante à possibilidade e validade de acordos coletivos de trabalho e convenções coletivas de trabalho firmados a partir da nova lei, e que adote regras diferentes das contidas nesta, como por exemplo, beneficiar apenas empregadas mulheres e com cobertura para filhos com idade de 48 meses, e não 5 anos e 11 meses como exige a nova lei, poderá esse fato gerar bastante discussão a respeito.

Nesse passo, é importante que se aguarde, tanto quanto possível, o Ato do Poder Executivo referido no parágrafo único do art. 2º da lei, que promete dispor sobre regras a serem aplicadas. Caso tal regulamentação não aborde o tema, é bom destacar, desde já, que será possível defender a validade de tais cláusulas livremente estabelecidas pelas partes, considerando que o parágrafo único, do art. 3º da lei em exame refere que os instrumentos normativos estabelecerão “condições, prazos e valores”, sem prejuízo do cumprimento dos demais preceitos de proteção à maternidade. Porém, a discussão nessa seara pode ser bastante intensa.

II. Teletrabalho

A lei ora examinada não altera a regulamentação existente sobre o teletrabalho, mas apenas inclui a obrigação de as empresas observarem a priorização de vagas relativas a teletrabalho, trabalho remoto ou trabalho a distância, às empregadas e aos empregados com filho, enteado ou criança sob guarda judicial com até 6 (seis) anos de idade, bem como às empregadas e aos empregados com filho, enteado ou pessoa sob guarda judicial com deficiência, sem limite de idade.

Aqui a lei é bastante silente sobre vários aspectos, não contribuindo para melhor disciplinar o tema, ditando apenas o princípio de que “os empregadores deverão conferir prioridade” às referidas modalidades de trabalho, ao grupo mencionado.

Cabe-nos apenas destacar que “prioridade” não significa “exclusividade”, motivo pelo qual a interpretação que nos parece correta é a de que o empregador que disponha de vagas de trabalho nas modalidades de teletrabalho, trabalho remoto ou a distância, deverá oferecê-las, primeiramente, aos empregados e empregadas mencionados, para depois abri-las aos demais, mas sem que haja reserva de vagas.

De qualquer forma, não nos parece tão simples cumprir essa obrigação, seja porque a lei não esclarece se a obrigação se aplica desde os atos de seleção de candidatos às vagas ou se está se referindo a alterações internas de contratos quanto à modalidade de prestação de serviços.

Além disso, os critérios de escolha de teletrabalhadores passam, também, por questões subjetivas de adaptabilidade funcional, requisitos pessoais de real domínio da atividade, capacidade de concentração do trabalho no ambiente familiar fora do ambiente empresarial, requisitos estes que não comportam priorização de vagas de forma objetiva.

Observe-se, também, que o teletrabalho não envolve apenas o trabalho em casa, ou seja, o “home office”, mas também o “anywere office”, ou seja, o trabalho remoto em qualquer local, mesmo diferentes da residência do empregado e da empregada, atual tendência de trabalho.

III. Flexibilização do regime de trabalho e das férias

O novo diploma legal estabelece que, respeitado o poder de comando do empregador e a real vontade expressa dos empregados que tenham filho, enteado ou pessoa sob sua guarda com até 6 (seis) anos de idade ou com deficiência, será “priorizada” a concessão de uma ou mais medidas, considerando a flexibilização da jornada de trabalho, regime de empo parcial, regime de banco de horas, à jornada de 12 x 36, a antecipação de férias individuais, bem como a flexibilização de horários de entrada e de saída do trabalho, respeitado o limite de tempo de até o segundo ano do nascimento do filho ou enteado, da adoção, ou guarda judicial.

Aqui, também, será exigível a formalização da concessão por acordo individual, acordo coletivo ou de convenção coletiva de trabalho.

Quanto ao banco de horas a nova lei traça regras quanto à hipótese de rescisão do contrato de trabalho de empregados em regime de banco de horas. Assim, quando a demissão for a pedido do empregado e este não tiver interesse ou não puder compensar a jornada devida durante o prazo do aviso prévio, as horas acumuladas no banco de horas ainda não compensadas serão descontadas das verbas decorrentes da rescisão, devidas ao empregado. Já na hipótese de banco de horas em favor do empregado ou da empregada, estas deverão ser pagas juntamente com as verbas decorrentes da rescisão do contrato.

De recordar-se que o parágrafo 3º do art. 59 da CLT já dispunha que na hipótese de rescisão de contrato de trabalho sem que tenha havido a compensação de saldo de horas a favor do empregado, este faz jus ao pagamento de horas extras não compensadas, calculadas sobre o valor da remuneração na data da rescisão. A novidade, portanto, é o desconto, na rescisão, do valor das horas não compensadas pelo empregado. Como o artigo 462 da CLT estabelece que ao empregador é vedado efetuar qualquer desconto nos salários do empregado, salvo quando este resultar de adiantamentos, de dispositivos de lei ou de contrato coletivo, estando agora previsto em lei o desconto, este passa a ser legítimo, afastando eventuais discussões antes existentes sobre a matéria.

Quanto à antecipação de férias individuais, a nova lei passa a permitir sejam antecipadas as férias por ato patronal, aos empregados até o segundo ano do nascimento do filho ou enteado, da adoção, ou da guarda judicial, ainda que não tenha transcorrido o seu período aquisitivo, mas não poderão ser usufruídas em período inferior a 5 (cinco) dias corridos.

Concedidas as férias nessa modalidade, o empregador poderá optar por efetuar o pagamento do adicional de 1/3 (um terço) de férias após a sua concessão, até a data em que for devido o décimo terceiro salário. Quanto ao pagamento das férias antecipadas, este poderá ocorrer até o 5º dia útil do mês seguinte ao início do gozo de férias, ou seja, poderá não haver o tradicional pagamento dois dias antes do início das férias. Caso haja rescisão do contrato e férias ainda não usufruídas, os valores correspondentes serão pagos com as verbas da rescisão, mas, haverá desconto no caso de pedido de demissão, se houve férias antecipadas e usufruídas sem estar cumprido o período aquisitivo.

No tocante à flexibilidade dos horários de entrada e saída para os empregados do grupo referido, a nova lei estabelece, quando a atividade permitir, que os horários fixos da jornada de trabalho poderão ser flexibilizados pelo empregador em intervalo de horário previamente estabelecido, considerados os limites inicial e final de horário de trabalho diário.

A lei não traz maiores dados quanto à operacionalidade e meios de contratação, o que parece apontar para posterior regulamentação pelo Executivo.

IV. Medidas para qualificação de trabalhadoras

Abrindo uma nova hipótese de suspensão do contrato de trabalho, estimulando a qualificação de empregadas mulheres e o desenvolvimento destas em habilidades e competências em áreas estratégicas ou com menor participação feminina, tais como, ciência, tecnologia, desenvolvimento e inovação, a lei estabelece agora que a empregada poderá solicitar a suspensão do seu contrato de trabalho para participar de cursos ou de programa de qualificação profissional sob responsabilidade do empregador.

A forma de suspensão observará o art. 476-A da CLT, ou seja, com suspensão de 2 a 5 meses, com duração equivalente à suspensão do contrato.

Tal suspensão de contrato poderá ocorrer via acordo individual entre empregador e empregada, acordo coletivo ou de convenção coletiva de trabalho, sendo que durante o período de suspensão do contrato de trabalho, a empregada fará jus à bolsa de qualificação profissional, sem prejuízo de espontâneo pagamento pelo empregador de uma ajuda compensatória, que não terá caráter salarial. O princípio básico, porém, é que a iniciativa da proposta de suspensão parta sempre da empregada (acordo individual) ou empregadas (instrumentos normativos), portanto, seja precedida de “requisição formal” das interessadas.

No caso de dispensa da empregada no transcurso do período de suspensão ou nos 6 (seis) meses subsequentes ao seu retorno ao trabalho, o empregador terá a obrigação de pagar à empregada, além das parcelas decorrentes da rescisão, uma multa a ser estabelecida em convenção ou em acordo coletivo, que será de, no mínimo, 100% (cem por cento) sobre o valor da última remuneração mensal anterior à suspensão do contrato de trabalho.

Estranha-se aqui o silêncio da lei em relação à hipótese de dispensa nos casos em que o ajuste se der por instrumento individual; entretanto, por dedução lógica, nos parece que, nessa hipótese, a multa será de no mínimo 100% sobre a remuneração independentemente de regra escrita nesse sentido, ou em valor superior, se o ajuste individual tiver essa previsão.

Entende-se, igualmente, que não se trata aqui de estabilidade ou garantia de emprego, mas sim, de mera sanção pecuniária que, uma vez satisfeita, isenta o empregador de qualquer outra obrigação adicional, ou maior reparo indenizatório, caso haja dispensa da empregada no período referido.

Quanto ao estímulo à ocupação das vagas de gratuidade dos serviços sociais autônomos, a nova lei estipula que as entidades dos serviços nacionais de aprendizagem (SENAI, SENAC, SENAR, SENAT, SESCOOP), mediante a celebração de ajustes e de parcerias com a União, poderão implementar medidas que estimulem a matrícula de mulheres em cursos de qualificação, em todos os níveis e áreas de conhecimento, observado o desenvolvimento de ferramentas de monitoramento e estratégias para a inscrição e a conclusão dos cursos por mulheres, com ênfase às áreas de ciência, de tecnologia, de desenvolvimento e de inovação, e priorizadas, mais uma vez, as mulheres hipossuficientes vítimas de violência doméstica e familiar com registro de ocorrência policial.

V. Medidas de apoio ao retorno ao trabalho da mulher, pós licença-maternidade

A nova lei estabelece que, mediante ajuste entre empregado interessado e empregador, acordo coletivo de trabalho ou convenção coletiva, poderá ser suspenso o contrato de trabalho do empregado com filho, cuja mãe tenha encerrado o período da licença-maternidade, com o objetivo de o pai prestar cuidados e estabelecer vínculos com os filhos, acompanhar o desenvolvimento destes e apoiar o retorno ao trabalho de sua esposa ou companheira. Também, neste caso, deve existir prévia requisição formal ao empregador do empregado ou empregados referidos.

A suspensão deverá acompanhar os termos do art. 476-A da CLT, ou seja, suspensão pelo período de 2 a 5 meses mediante bolsa de qualificação, com participação do empregado em curso ou em programa de qualificação profissional oferecido pelo empregador e sem prejuízo de concessão espontânea de ajuda compensatória pelo empregador.

A carga horária máxima do curso será de 20 (vinte) horas semanais e será realizado, exclusivamente, na modalidade não presencial, preferencialmente, de forma assíncrona, ou seja, aulas gravadas disponibilizadas ao aluno em horários livres (videoaulas), sem interações ao vivo.

Nesse caso, também haverá sanção em caso de a dispensa do empregado ocorrer no transcurso do período de suspensão ou nos 6 (seis) meses subsequentes ao seu retorno ao trabalho, qual seja, pagamento de multa que será de no mínimo 100% (cem por cento) sobre o valor da última remuneração mensal anterior à suspensão do contrato. Valem aqui, portanto, as observações feitas anteriormente sobre os cursos de qualificação das mulheres.

Como obrigações do empregador a lei refere, ainda, a ampla divulgação aos seus empregados sobre a possibilidade de apoiar o retorno ao trabalho de suas esposas ou companheiras após o término do período da licença-maternidade, a orientação sobre os procedimentos necessários para firmar acordo individual para suspensão do contrato de trabalho com qualificação, e a promoção de ações periódicas de conscientização sobre parentalidade responsiva e igualitária para impulsionar a adoção da medida pelos seus empregados.

VI. Alterações no programa empresa cidadã

Como referido ao início deste texto, a nova lei alterou o art. 20 da lei 11.770/08 que criou o Programa Empresa Cidadã (prorrogação da licença-maternidade mediante concessão de incentivo fiscal). Registre-se que com o advento da Medida Provisória 1.116/22, convertida agora na lei 14.457/22, algumas disposições já haviam sido inseridas na lei 11.770/08. Com a conversão da MP em lei, as alterações se tornam definitivas.

Nesse aspecto, a nova lei apenas repete as alterações já ocorridas quando do advento da Medida Provisória, restando estabelecido, definitivamente, que a prorrogação da licença-maternidade poderá ser compartilhada entre a empregada e o empregado requerente, desde que ambos sejam empregados de pessoa jurídica aderente ao Programa e que a decisão seja adotada conjuntamente, na forma estabelecida em regulamento, e que a prorrogação poderá ser usufruída pelo empregado da pessoa jurídica que aderir ao Programa somente após o término da licença-maternidade, desde que seja requerida com 30 (trinta) dias de antecedência.

O mesmo ocorre em relação à regra já contida anteriormente na MP 1.116/22 segundo a qual fica a empresa participante do Programa Empresa Cidadã autorizada a substituir o período de prorrogação da licença-maternidade pela redução de jornada de trabalho em 50% (cinquenta por cento) pelo período de 120 (cento e vinte) dias, desde que cumpridos os seguintes requisitos: a) haja o pagamento integral do salário à empregada ou ao empregado pelo período de 120 (cento e vinte) dias; e b) seja firmado acordo individual entre o empregador e a empregada ou o empregado interessados em adotar a medida.

VII. Regras para formalização de acordos individuais

Em que pese a lei anuncie a existência de “regras para formalização de acordos individuais” há, na verdade, escassez de regras na lei em relação aos ajustes individuais, seja quanto à forma, seja quanto ao conteúdo formal e material daqueles, o que pode levar à necessidade de regulamentação pelo Executivo, como já referimos neste trabalho.

O que a lei traz, na verdade, é apenas um princípio aplicável a todas as hipóteses de ajustes individuais previstos na nova lei, qual seja, o princípio de que deverá sempre ser levada em conta a vontade expressa da empregada ou do empregado beneficiados pelas medidas de apoio ao exercício da parentalidade. É o que estabelece do art. 22 da nova lei.

Parte-se do princípio claro, portanto, de que a iniciativa de interesse na adoção das medidas previstas, deve ter por supedâneo a vontade clara das empregadas e empregados beneficiados, não podendo o empregador presumir dita vontade, por mais argumentos que tenha em relação a esta ou aquela medida ser benéfica aos trabalhadores.

VIII. A nova CIPA – Medidas de prevenção e de combate ao assédio sexual e a outras formas de violência no âmbito do trabalho –

Nesse ponto, a nova lei traz efetivas novidades – mas muitas dúvidas quanto à legitimidade da CIPA – no combate ao assédio sexual e outras violências no trabalho, apontando caminhos para a promoção de um ambiente laboral saudável, a partir de ações e novas competências das CIPAs.

De recordar-se que em 7 de outubro de 2021, foi publicada a atualização da Norma Regulamentadora da CIPA, a chamada nova NR 5, por meio da Portaria MTP 422. Essa mesma portaria alterou o alcance de atuação das CIPAs, estendendo o objetivo das comissões à “prevenção de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho, de modo a tornar compatível permanentemente o trabalho com a preservação da vida e promoção da saúde do trabalhador”, quando, anteriormente, era apenas a “prevenção de acidentes e doenças decorrentes do trabalho”, significando que as doenças e acidentes a serem objeto de ação das CIPAs, não precisam, necessariamente, ser consequência ou ter sua origem no trabalho; porém, certo é que não dispôs essa portaria sobre novas regras específicas envolvendo o assédio sexual e outras formas violentas no trabalho.

De qualquer forma, a lei ora em exame altera o art. 163 da CLT para estabelecer a nova denominação da CIPA, que até então era “COMISSÃO INTERNA DE PREVENÇÃO DE ACIDENTES – CIPA”, passando a ser “COMISSÃO INTERNA DE PREVENÇÃO DE ACIDENTES E DE ASSÉDIO – CIPA” como referem os art. 23, “caput”, e art. 32 da nova lei que reporta a instruções a serem expedidas pelo Ministério do Trabalho e Previdência.

Nesse sentido, a lei estabelece o prazo de 180 (cento e oitenta) dias após a sua entrada em vigor, para o cumprimento dessas regras junto às CIPAs e empresas e declara que a adoção das medidas preventivas e punitivas apontadas não substitui eventual responsabilização penal do agressor (art. 216-A do Código Penal).

As novas CIPAs das empresas terão a obrigação de estabelecer regras comportamentais no ambiente de trabalho (registre-se que a lei usa a expressão “deverão adotar”), sem prejuízo de outras na mesma natureza e objetivo, para combater o assédio sexual e outras formas de violência no âmbito do trabalho, mediante inclusão de normas internas nas empresas, com ampla divulgação a todos os trabalhadores.

Segundo a nova lei, será obrigatória a adoção de medidas pela CIPA da empresa, de forma a estabelecer expressamente regras de comportamento geral nas empresas, envolvendo a inibição ao assédio sexual e à violência no trabalho.

Verifica-se que o novo regramento contido na lei refere a obrigação de a CIPA estabelecer procedimentos quanto às denúncias recebidas na comissão, inclusive quanto à “aplicação de sanções administrativas aos responsáveis diretos e indiretos pelos atos de assédio sexual e de violência” preservado sempre o anonimato de quem denuncia.

Assim, aparentemente, e de forma surpreendente, a lei em questão parece declarar, indiretamente, que passa a ser atribuição da “nova” CIPA, fixar procedimentos para a aplicação de “sanções administrativas” após apuradas as responsabilidades, aos responsáveis diretos e indiretos, pelos atos de assédio sexual e de violência no trabalho.

Porém, não parece ser essa a melhor interpretação.

Ora, as atribuições da CIPA estão previstas hoje na NR-5 como já se referiu, que foi recentemente atualizada. Dentre as suas atribuições até então em vigor, não consta a atribuição à comissão de aplicação direta de sanções disciplinares a quem quer que seja, muito menos a responsáveis diretos e indiretos por assédio ou violência no trabalho, até porque a aplicação de sanções administrativas é ínsita ao poder de comando do empregador, não aos integrantes das CIPAs.

Com efeito, hoje a CIPA tem atribuições definidas e restritas aos itens que a norma aponta, quais sejam: a) acompanhar o processo de identificação de perigos e avaliação de riscos, bem como a adoção de medidas de prevenção implementadas pela organização; b) registrar a percepção dos riscos dos trabalhadores, em conformidade com o subitem 1.5.3.3 da NR-1, por meio do mapa de risco ou outra técnica ou ferramenta apropriada à sua escolha, sem ordem de preferência, com assessoria do Serviço Especializado em Segurança e em Medicina do Trabalho – SESMT, onde houver; c) verificar os ambientes e as condições de trabalho, visando identificar situações que possam trazer riscos para a segurança e saúde dos trabalhadores; d) elaborar e acompanhar plano de trabalho que possibilite a ação preventiva em segurança e saúde no trabalho; e) participar no desenvolvimento e implementação de programas relacionados à segurança e saúde no trabalho; f) acompanhar a análise dos acidentes e doenças relacionadas ao trabalho, nos termos da NR-1, e propor, quando for o caso, medidas para a solução dos problemas identificados; g) requisitar à organização as informações sobre questões relacionadas à segurança e saúde dos trabalhadores, incluindo as Comunicações de Acidente de Trabalho – CAT emitidas pela organização, resguardados o sigilo médico e as informações pessoais; h) propor ao SESMT, quando houver, ou à organização, a análise das condições ou situações de trabalho nas quais considere haver risco grave e iminente à segurança e saúde dos trabalhadores e, se for o caso, a interrupção das atividades até a adoção das medidas corretivas e de controle; e i) promover, anualmente, em conjunto com o SESMT, onde houver, a Semana Interna de Prevenção de Acidentes do Trabalho – SIPAT, conforme programação definida pela CIPA.

Como se vê, não consta dentre suas atribuições, pelo menos até o advento da nova lei, a competência e legitimidade da CIPA para determinar a inclusão de normas internas de procedimentos nas empresas para temas como assédio sexual ou violência no trabalho, nem, muito menos, fixar procedimentos para aplicação de sanções administrativas aos responsáveis.

Assim, na nossa opinião, salvo melhor juízo, o correto encaminhamento da expedição de instruções pelo Ministério do Trabalho e Previdência, deveria levar em conta que a CIPA deve trabalhar em conjunto com as direções das respectivas empresas, relativamente aos procedimentos para acompanhamento de denúncias relativas aos temas em foco, e quaisquer outros vinculados e doenças e segurança do trabalho, limitando-se, o procedimento da comissão, porém, aos estudo e elaboração de regras para apuração dos fatos denunciados e de aplicações de sanções, respeitado sempre o sigilo do denunciante e denunciado, e o poder de comando do empregador, que não pode ser delegado à CIPA.

Para nós, eventuais sanções administrativas serão sempre aplicadas segundo os critérios a serem estabelecidos pela direção de cada empresa, mediante apuração e decisão final do empregador, quanto a essas responsabilidades e punições, pois não se pode admitir, sob pena de evidente inversão hierárquica, a simples redução do poder de comando do empregador garantido no art. 2º da CLT, e o aumento repentino e pontual das atribuições das CIPAs, com inesperado empoderamento da comissão, em temas específicos acima do poder diretivo da empresa.

Considerando-se que, como já se referiu, o art. 32 da nova lei, alterando expressamente o art. 163 da CLT, estabeleceu que “será obrigatória a constituição de Comissão Interna de Prevenção de Acidente e de Assédio (CIPA), em conformidade com instruções expedidas pelo Ministério do Trabalho e Previdência, nos estabelecimentos ou nos locais de obra nelas especificadas” , é prudente que se preconize pelo melhor encaminhamento do tema pelo Ministério do Trabalho e Previdência, considerando sua competência constitucional para baixar instruções sobre o tema.

 

Segundo a nova lei, caberá ainda às CIPAs a inclusão de temas referentes à prevenção e ao combate ao assédio e a outras formas de violência nas atividades e nas suas práticas, com realização, no mínimo a cada 12 (doze) meses, de ações de capacitação, de orientação e de sensibilização dos empregados e das empregadas de todos os níveis hierárquicos da empresa sobre temas relacionados à violência, ao assédio, à igualdade e à diversidade no âmbito do trabalho, em formatos acessíveis, apropriados e que apresentem máxima efetividade de tais ações, conforme estabelece a nova lei, o que nos parece correto, como atribuição da comissão, o que nos parece correto.

IX. Selo “Emprega + Mulher”

A lei em exame institui o SELO “EMPREGA + MULHER”, com o objetivo de premiar as empresas que se destaquem pela aplicação dos princípios estabelecidos, objetivos

da lei, conforme descrição de objetivos nela apontados, tais como, organização e manutenção de creches e boas práticas de empregadores.

As microempresas que se habilitarem ao recebimento do Selo, conforme regras a serem estabelecidas pelo Poder Executivo, serão beneficiadas com estímulos de crédito, enquanto as demais empresas detentoras do Selo poderão utilizá-lo para divulgação de sua marca, produtos e serviços, vedada a extensão do uso a empresas do mesmo grupo econômico não agraciadas com o Selo.

X. Estímulo ao microcrédito para mulheres e acesso ao PRONATEC

A nova lei estabelece condições diferenciadas relativamente ao SIM Digital, da lei 14.438/22, às mulheres que exerçam alguma atividade produtiva ou prestação de serviços, urbana ou rural, de forma individual ou coletiva, na condição de pessoas naturais, ou na condição de pessoas naturais e de microempreendedoras individuais no âmbito do PNMPO, com concessão de linhas de créditos dois mil a cinco mil reais, e taxas de juros especial.

Altera, também, o art. 2º da lei 12.513/11, que trata do PRONATEC, para inserir o item V, ficando assim o referido dispositivo legal:

“Art. 2º O Pronatec atenderá prioritariamente:

I – Estudantes do ensino médio da rede pública, inclusive da educação de jovens e adultos; II – trabalhadores; III – beneficiários dos programas federais de transferência de renda; IV – estudante que tenha cursado o ensino médio completo em escola da rede pública ou em instituições privadas na condição de bolsista integral, nos termos do regulamento. e V – mulheres vítimas de violência doméstica e familiar com registro de ocorrência policial. ”

XI. Outras disposições sobre igualdade salarial entre empregados e empregadas e ausências ao trabalho – Alterações na CLT

O art. 30 da lei em exame dispõe que “Às mulheres empregadas é garantido igual salário em relação aos empregados que exerçam idêntica função prestada ao mesmo empregador, nos termos dos arts. 373-A e 461 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo decreto-lei 5.452, de 1º de maio de 1943.”

Para nós, não há qualquer novidade a considerar, até pelos próprios termos do novo dispositivo que se reporta a outros artigos de lei já existentes, e que já tratam convenientemente exaustivamente da matéria, para declarar direito líquido e certo que a lei já declarava e protegia. O dispositivo na prática, portanto, parece apenas atender ao clamor tão em voga no país de combater mais intensamente a diferença de tratamento salarial entre homes e mulheres, razão pela qual o mérito parece ser mesmo o de reafirmar a necessidade de observar esse princípio.

Trata a lei, também, das iniciativas que deverão ser adotadas pelo SINE para melhoria da empregabilidade de mulheres que tenham filhos até cinco anos, das que sejam chefes de família monoparental, ou com deficiência, ou com filho com deficiência.

Outra alteração da CLT, agora relativamente ao art. 473, é a mudança do inciso III, passando de 1 dia para 5 dias consecutivos, a contar da data do nascimento do filho, o direito de o empregado deixar de comparecer ao serviço, por nascimento de filho, acrescentando-se agora os casos de adoção ou de guarda compartilhada.

No mesmo art. 473, houve alteração no inciso X, passando de 2 dias para até 6 consultas e “pelo tempo necessário”, o que, na nossa interpretação, poderá ocorrer, por exemplo, em um turno de trabalho em cada ocasião, para o empregado acompanhar sua esposa ou companheira em consultas médicas, ou em exames complementares.

A lei entra em vigor na data de sua publicação, ou seja, 22 de setembro de 2022, lembrando que para a constituição de CIPA com o novo formato, haverá o prazo de 180 dias, e ato do Ministério do Trabalho do Trabalho e Previdência, que deverá baixar instruções a respeito.

Fonte: www.migalhas.com.br/