Geral

OAB/RS – Justiça determina a imediata devolução dos vales-refeição aos trabalhadores

Leia a integra da decisão abaixo:

Poder Judiciário
Justiça do Trabalho
Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região
Ação Trabalhista – Rito Ordinário
0020587-06.2020.5.04.0002
Processo Judicial Eletrônico
Data da Autuação: 27/07/2020
Valor da causa: R$ 683.100,00
Partes:
AUTOR: SINDICATO DOS SERVIDORES E EMPREGADOS DOS CONSELHOS E ORDENS
DE FISCALIZACAO DO EXERCICIO PROFISSIONAL – SINSERCON
ADVOGADO: JAIRO NAUR FRANCK
RÉU: ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL SECCAO DO RIO G DO SUL

PAGINA_CAPA_PROCESSO_PJE ADVOGADO: MARIA BEATRIZ DOS SANTOS SELISTRE
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO
2ª VARA DO TRABALHO DE PORTO ALEGRE
ATOrd 0020587-06.2020.5.04.0002
AUTOR: SINDICATO DOS SERVIDORES E EMPREGADOS DOS CONSELHOS E
ORDENS DE FISCALIZACAO DO EXERCICIO PROFISSIONAL – SINSERCON
RÉU: ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL SECCAO DO RIO G DO SUL
I – RELATÓRIO
SINDICATO DOS SERVIDORES E EMPREGADOS DOS CONSELHOS E
ORDENS DE FISCALIZAÇÃO DO EXERCÍCIO PROFISSIONAL – SINSERCON ajuíza ação
trabalhista em face de ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL SECÇÃO DO RIO GRANDE
DO SUL, postulando os direitos arrolados no pedido, atribuindo à causa o valor de R$
683.100,00.
Ouvida a parte contrária, a tutela de urgência é indeferida, conforme decisão de
ID 11c1e36.
Rejeitada a conciliação, a reclamada contesta.
Em instrução, são juntados documentos.
Sem outras provas, é encerrada a instrução processual, com razões finais.
Recusada a conciliação.
Os autos vêm conclusos para julgamento, na forma da Portaria 124, de 20/01
/2021, da Corregedoria Regional.
É o relatório.
II – FUNDAMENTAÇÃO
Discute-se nos autos o direito de recebimento, por parte dos substituídos, do
vale-refeição, alegadamente suprimido/reduzido a partir de abril/2020, nas mesmas condições
em que até então fornecido pela empregadora.
De acordo com a peça inicial, trata-se de benefício previsto unicamente no acordo
coletivo de trabalho de 1998/1999 (com vigência de 01/05/1998 até 30/04/1999, não constando
das normas coletivas posteriores), o qual, contudo, continuou sendo pago, por mais de 20 (vinte)
vinte anos, passando a integrar o contrato de trabalho, sendo inviável a sua supressão (para
empregados em “home office”) ou redução (plantão presencial na OAB), na forma promovida
pela reclamada sob justificativa da pandemia da Covid-19.
A reclamada, por sua vez, sustenta a regularidade do procedimento, à luz da pandemia e
da consequente crise econômica enfrentada, com redução de arrecadação oriunda das
contribuições, invocando, ainda, a impossibilidade de ultratividade das normas coletivas e a
natureza indenizatória do benefício, à luz da sua inscrição no PAT, e argumentando que o vale-refeição se destina à realização de refeições próximo ao local de trabalho, o que não seria mais
possível em virtude das restrições do Poder Público.
Examino.
De plano, ante os termos da defesa, insta reconhecer a ausência de controvérsia fática
quanto à origem do benefício (acordo coletivo de trabalho de 1998/1999, com vigência até 30/04
/1999 – fls. 54-58), à inexistência de normas coletivas posteriores disciplinando o seu pagamento
e ao momento de sua supressão/redução (a contar de abril/2020), do que exsurge a conclusão
inicial de que o benefício, de fato, por mais de vinte anos seguiu sendo pago pela reclamada,
sem qualquer norma coletiva que impusesse ou disciplinasse o seu pagamento.
Nesse contexto, a solução da lide principal (direito ou não ao restabelecimento do
benefício, nos mesmos patamares) não passa diretamente pela identificação da natureza do
benefício (salarial ou indenizatória, matéria a seguir analisada). Mas, sim, pelo reconhecimento
de que, se não havia norma legal ou coletiva a disciplinar o pagamento, este se deu por
liberalidade da empregadora, passando a integrar o contrato de trabalho dos empregados, sendo
ilícita a sua supressão ou redução pela empregadora (CLT, art. 468).
É inócua, assim, a própria argumentação defensiva, relacionada à impossibilidade de
ultratividade de normas coletivas. Afinal, a parte autora não busca a aplicação de normas
coletivas para além da sua vigência, mas sim o restabelecimento de condição contratual
benéfica, que aderiu aos contratos por ação da própria reclamada.
De igual sorte, as dificuldades financeiras enfrentadas pela reclamada em virtude
da pandemia do Covid-19, em decorrência de diminuição de sua arrecadação, embora
presumíveis (e tão somente presumíveis, afinal nenhum documento nesse sentido veio aos
autos), não autorizam a alteração contratual nos moldes promovidos, seja porque inerentes à
condição de empregador (CLT, art. 2º), seja porque o próprio Poder Público editou normas
trabalhistas para enfrentamento de tais dificuldades.
Neste sentido, por exemplo, a própria MP 927/2020, invocada na defesa, a qual
previa, no período de sua vigência, a possibilidade de adoção, pelo empregador, de medidas
destinadas ao enfrentamento dos efeitos econômicos decorrentes do estado de calamidade, a
exemplo do teletrabalho, antecipação de férias e diferimento do recolhimento do FGTS (art. 3º).
Não há, porém, autorização para supressão ou redução de benefício destinado à
alimentação do trabalhador (independentemente da sua natureza), muito menos com base no
critério adotado pela reclamada, relacionado ao local da prestação de serviços (na sede da
reclamada ou “home office”), quando a lei é expressa ao rejeitar tal distinção (CLT, art. 6º), sendo
igualmente irrelevante que a alimentação ocorra próximo ou não ao trabalho.
Pelo exposto, independentemente do local de trabalho (sede da reclamada ou
“home office”), da natureza da parcela e do contexto pandêmico, condeno a reclamada a pagar
aos substituídos processualmente no feito, identificados em liquidação, o vale-refeição (suprimido
ou reduzido, conforme o caso, deduzidos os valores comprovadamente quitados, apurados em
liquidação), a contar de abril/2020, em parcelas vencidas e vincendas (CPC, art. 505).
O benefício será pago nos mesmos moldes praticados (a teor do documento de
fls. 68 e ss., na base de R$ 550,00 por mês, correspondente a 22 vales de R$ 25,00 cada),
independentemente da jornada, também no período de férias e sem qualquer desconto relativo a
custeio (ausente quaisquer alegações defensivas em contrário).
Registro, por oportuno, que, após o exame da controvérsia em juízo de cognição
exauriente, conforme fundamentados acima, reputo presentes a probabilidade do direito e o
perigo de dano decorrente da não percepção de benefício destinado à alimentação (CPC, art.
300, caput), não se identificando perigo de irreversibilidade, uma vez, em caso de reforma da
sentença por eventual juízo recursal, os valores recebidos pelos substituídos poderão ser objeto
de compensação, o que desde já se autoriza (CPC, art. 300, §3º).
Assim, concedo inclusive a tutela antecipatória, independentemente do trânsito
em julgado, para fins de restabelecimento do pagamento do vale-refeição a contar do mês
vigente (março/2021), no prazo de 5 (cinco) dias úteis a contar da intimação desta publicação,
bem como para quitação dos valores eventualmente ainda em atraso da parcela (entre abril/2020
e fevereiro/2021), em relação a cada substituído, em quatro parcelas iguais, considerando a
quantidade de empregados e o contexto da pandemia – até o 5º (quinto) dia útil dos meses de
abril/2021, maio/2021, junho/2021 e julho/2021 –, tudo sob pena de multa de R$ 100,00 por dia
de atraso e por substituído prejudicado (CPC, art. 536, § 1º).
Cumpre registrar, por oportuno, que o informativo da reclamada de fl. 171 noticia
crédito de vale-refeição a ser realizado no mês de dezembro/2020, mas não informa se ocorreria
a todos os empregados ou na forma declarada ilícita nos presentes autos (com supressão ou
redução). Desse modo, naturalmente, os valores devidos, no período de abril/2020 e fevereiro
/2021 acima definido, serão apenas aqueles ainda pendentes de pagamento.
De outro lado, não há falar em acréscimo previsto no art. 467 da CLT, diante da
controvérsia estabelecida.
Os valores devidos serão atualizados monetariamente e acrescidos de juros de
mora, conforme liquidação.
Quanto à natureza da parcela (CLT, art. 832, § 3º), como visto acima, o benefício
era pago por força do contrato, em virtude da sua aderência a este, ao passo que a adesão da
reclamada ao PAT ocorreu em 16/07/2008, fl. 59.
Desse modo, o benefício tem natureza salarial em relação aos substituídos que
já o recebiam antes da adesão (TST, Súmula 241; TST, SDI-1, OJ 413) e indenizatória em
relação aos substituídos contratados a contar da adesão (Lei 6.321/76; TST, SDI-1, OJ 133).
Autorizo, pois, os recolhimentos previdenciários e fiscais cabíveis, conforme
critérios definidos em liquidação.
De outro lado, ajuizada a presente ação na vigência da Lei 13.467/2017, são
aplicáveis as disposições pertinentes à sucumbência e à justiça gratuita, descabendo cogitar a
inconstitucionalidade nos aspectos relacionados.
Desse modo, considerando a sucumbência integral (ou mínima), condeno o
reclamado ao pagamento de honorários, de 15% sobre o valor da condenação liquidada (CLT,
art. 791-A).
Noutro giro, seja diante da ausência de sucumbência, ou sucumbência mínima,
seja diante da natureza da presente ação e da ausência de má-fé, não há falar em condenação
do sindicato autor ao pagamento de honorários de advogado (Lei 7.347/85, arts. 17 e 18).
Por fim, concedo ao sindicato autor o benefício de justiça gratuita, uma vez que o
sindicato atua em nome próprio, porém postulando direito alheio, dos substituídos
processualmente no feito (CLT, art. 790, §§).
III – DISPOSITIVO
DIANTE DO EXPOSTO, julgo PROCEDENTES os pedidos formulados por SINDICATO DOS
SERVIDORES E EMPREGADOS DOS CONSELHOS E ORDENS DE FISCALIZAÇÃO DO
EXERCÍCIO PROFISSIONAL – SINSERCON em face de ORDEM DOS ADVOGADOS DO
BRASIL SECÇÃO DO RIO GRANDE DO SUL para: a) condenar a reclamada a pagar aos
substituídos, atendidos todos os critérios da fundamentação, o vale-refeição (suprimido ou
reduzido, conforme o caso, deduzidos os valores comprovadamente quitados, tudo conforme se
apurar em liquidação), a contar de abril/2020, em parcelas vencidas e vincendas; b)
conceder tutela antecipatória, independentemente do trânsito em julgado, determinando à
reclamada o restabelecimento do pagamento do vale-refeição a contar do mês vigente (março
/2021), nos moldes acima, no prazo de 5 (cinco) dias úteis a contar da intimação desta
publicação, bem como a quitação dos valores eventualmente ainda em atraso da parcela (entre
abril/2020 e fevereiro/2021), em relação a cada substituído, em quatro parcelas iguais – até o 5º
(quinto) dia útil dos meses de abril/2021, maio/2021, junho/2021 e julho/2021 –, tudo sob pena de
multa de R$ 100,00 por dia de atraso e por substituído prejudicado. Os valores devidos serão
apurados em liquidação, com juros de mora e correção monetária. Recolhimentos
previdenciárias e fiscais, conforme critérios fixados em liquidação. Concedo ao sindicato autor o
benefício de justiça gratuita. Condeno a reclamada ao pagamento de honorários advocatícios, de
15% sobre o valor da condenação liquidada. Custas de R$ 10.000,00, calculadas sobre o valor
de R$ 500.000,00, arbitrado provisoriamente à condenação, pela reclamada (CLT, art. 789).
Cumpra-se após o trânsito em julgado, salvo quanto ao item “b” acima. Intimem-se as partes. Em
04/03/2021. NADA MAIS.
TIAGO DOS SANTOS PINTO DA MOTTA
Juiz do Trabalho Substituto
PORTO ALEGRE/RS, 04 de março de 2021.
TIAGO DOS SANTOS PINTO DA MOTTA
Juiz do Trabalho Substituto
Assinado eletronicamente por: TIAGO DOS SANTOS PINTO DA MOTTA – Juntado e